domingo, 31 de maio de 2020

Ainda não esqueci

Foi há muito tempo...

Foi quando se instalaram as Rádios Pirata. Dum instante para o outro passou a haver um Estúdio Radiofónico em várias localidades e Montemor foi uma delas.
Durante muitos anos reinou a Emissora Nacional e de modo menos exuberante também o Rádio Clube Português, a Renascença e os Emissores do Norte Reunidos, situados respectivamente em Lisboa e no Porto. Apenas transmitiam.  Nunca qualquer voz do exterior seria considerada para ser dali transmitida.
Assim, a vinda das Piratas foi uma glória, porque dava voz a quem quisesse para lá telefonar e ser ouvida. A maior parte dos programas eram mesmo nesse sentido - faziam uma pergunta e abriam o microfone para os ouvintes que quizessem participar. E claro sucediam-se os telefonemas e ouviam-se as vozes de quem estava longe ou perto. Havia prémios para quem respondesse certo, e aquela quase brincadeira foi um êxito durante anos.
Naquela noite em casa na Figueira, eu ouvi a pergunta (qual o nome da Capital do Egito) e como sabia a resposta telefonei. E tive sorte porque ninguém mais acertou, e por isso eu ganhei o prémio que eram duas Morcelas da Beira, da Firma que tinha publicitado aquela hora de programa.
Ganhar é ganhar, fiquei contente, mas ainda mais porque seria um bom pretexto para pela primeira vez eu ir ver um Estudio Radiofónico. E assim aconteceu.
No dia seguinte à noite, o Jornalista Santiago Pinto nosso amigo, residente numa das Freguesias de Montemor, mais propriamente Vila Nova da Barca, iria deslocar-se à Rádio porque também ele tinha ali um programa a seu encargo. Havia convidado o meu marido para fazer parte, e eu como tinha as Morcelas para trazer, aproveitei a oportunidade e lá fomos os dois para Montemor pela estrada velha, que a actual ainda não existia.
Encontrámo-nos no Café e seguimos juntos. Lá chegados, primeiro fui saber das Morcelas. O nosso amigo que já sabia o local aonde eram colocados os prémios, estranhou não ver lá nada do género e foi saber. Ficou quase numa fúria - os rapazes que tinham feito aquela hora de Rádio tinham-nas comido. Ele classificou o facto como falta de respeito, e o caso chegou aos responsáveis da Rádio, mas também ao patrocinador, que até acabou por achar graça e dizer que na próxima semana me trazia as Morcelas, não duas, mas três! (mais uma para me compensar pela espera)
E assim como prometeu assim cumpriu. Ainda hoje recordo o delicioso tempero muito agradável ao paladar. E também de ficar  a saber como era um Estúdio Radiofónico. Aquele era muito singelo, pequenino, mas ouvia-se a uma boa distância, e assim foi por largo tempo até que a Lei entretanto promulgada o silênciou, como a mais alguns em iguais condições.

sábado, 11 de abril de 2020

Desculpas e Saudações Pascais!

Caras amigas e amigos, eu quero apresentar desculpas pelo atraso no envio deste meu livro. Tal facto deve-se à situação que se vive, e eu estar "em prisão domiciliária", isto de ser velha é um posto... Mas, haja esperança. Para vós amigos, conhecidos, e desconhecidos também, vão os meus desejos de que vivam a Páscoa com saúde e paz! Abraço forte!



sábado, 21 de março de 2020

Nesta altura de tantos receios, tanta incerteza e desânimo que estamos a atravessar, encontrei estes versos do grande Poeta Fernando Pessoa, e pareceram-me escritos para hoje...

Nevoeiro

Nem rei nem lei, nem paz nem guerra,
Define com perfil e ser
Este fulgor baço da terra
Que é Portugal a entristecer —
Brilho sem luz e sem arder
Como o que o fogo-fátuo encerra.
Ninguém sabe que coisa quer.
Ninguém conhece que alma tem,
Nem o que é mal nem o que é bem.
(Que ânsia distante perto chora?)
Tudo é incerto e derradeiro.
Tudo é disperso, nada é inteiro.
Ó Portugal, hoje és nevoeiro...
É a hora!

(Fernando Pessoa)

terça-feira, 25 de fevereiro de 2020

É Carnaval, ninguém leva a mal... Será ?

Noite de Núpcias

Enquanto despia o fraque
Junto ao leito de noivado
Escapuliu-se lhe um traque
De timbre aclarinetado...

A noiva olhou-o de lado
E pôs-se, com ar basbaque,
A remirar o bordado
Das botinas de duraque...

Houve, após esse momento,
Naquela noite de gala,
Um duplo constrangimento.

E o noivo disse-lhe então:
- Ó filha, cu que não fala
é cu sem opinião...

      Augusto Gil

(Serão mesmo da sua autoria ? )

terça-feira, 4 de fevereiro de 2020

O que seria do mundo sem os Poetas e a beleza das suas rimas...


Transcrevemos, de Folhas Caídas,
um dos poemas mais conhecidos de Garrett )

OLHOS NEGROS

Por teus olhos negros, negros,
Trago eu negro o coração,
De tanto pedir-lhe amores...
E eles a dizer que não.

E mais não quero outros olhos,
Negros, negros como são;
Que os azúis dão muita esp'rança,
Mas fiar-me eu neles, não.

Só negros, negros os quero;
Que, em lhes chegando a paixão,
Se um dia disserem sim...
Nunca mais dizem que não.

sábado, 1 de fevereiro de 2020

Morena

Não negues, confessa
Que tens certa pena
Que as mais raparigas
Te chamem morena.

Pois eu não gostava,
Parece-me a mim,
De ver o teu rosto
Da cor do jasmim.

Eu não... mas enfim
É fraca a razão,
Pois pouco te importa
Que eu goste ou que não.

Mas olha as violetas
Que, sendo umas pretas,
O cheiro que têm!
Vê lá que seria,
Se Deus as fizesse
Morenas também!

Tu és a mais rara
De todas as rosas;
E as coisas mais raras
São mais preciosas.

Há rosas dobradas
E há-as singelas;
Mas são todas elas
Azuis, amarelas,
De cor de açucenas,
De muita outra cor;
Mas rosas morenas,
Só tu, linda flor.

E olha que foram
Morenas e bem
As moças mais lindas
De Jerusalém.
E a Virgem Maria
Não sei... mas seria
Morena também.

Moreno era Cristo.
Vê lá depois disto
Se ainda tens pena
Que as mais raparigas
Te chamem morena!

Guerra Junqueiro, in 'A Musa em Férias'
// C