terça-feira, 21 de julho de 2009

As quatro estações

Primavera

Sabeis quem sou? - Primavera;
riso do ano;quimera
feita de luz e de flores!
É tamanho o meu poder,
que até no peito da fera,
que é fera,semeio amores!

Por saudar-me,o Céu veste
do mais puro azul celeste
salpicado de estrelinhas!
Brilha o Sol com mais fulgor,
foge,corrido,o nordeste,
visitam-me as andorinhas!

Estio

Da Primavera sou filho.
Chamo-me Estio,e perfilho
as intenções da mamã!
Ela fecunda,e eu crio;
dou forma ao trigo e ao milho
e adoço a verde maçã!

A todos dou agasalho!
Sou capa de órfãos e espalho
por toda a parte alegrias!
Imponho tréguas à dôr,
canto louvores ao trabalho
e ao pão de todos os dias!

Outono

Eu sou quem parte e reparte,
com equidade e com arte,
o prémio do bom labor!
Dou alento a pobre e a rico
e faço que em toda a parte
reinem a paz e o amor!

Sucessor do quente Estio,
tenho, também o meu brio,
meu valor,minha magia!
Nas colheitas,nas vindimas,
há cantares ao desafio,
há mil estos de alegria!

Inverno

Chama-me o rico - O Inverno;
o pobre chama-me Inferno
feito de agudas tristezas.
Sou frio, ásp’ro,severo,
e,contudo,o Padre-Eterno
quis que eu tivesse belezas!

Deu-me as festas do Natal,
Deu-me os Reis,o Carnaval,
deu-me os serões em familia...
Como vêdes,não mereço
que me queiram nenhum mal
nem por mim tenham quisília!

Autor - A.Serra e Moura
(em Outubro de 1926)

E quem era Serra e Moura?
Vivia em Montemor-o-Velho nesta data,penso eu...
Escreveu estes versos (a que deu o nome de As Quatro Estações) numa tira de papel almaço, e ofereceu-os ao meu pai que os guardou.Muito,muito,mais tarde é o meu pai que mos mostra e oferece,e que eu guardo também.Hoje,ao reler esta poesia,ver a letra "desenhada"que se usava na época,o papel já amarelecido,mas conservado,e saber que 82 anos passaram sobre este trabalho,decidi colocá-lo no blogue.Quero dizer que transcrevi na integra,exactamente como o autor escreveu.
Eu serei uma exagerada,talvez valorize,sem motivo... "é pouco mais que um papel com 82 anos"... dirão os mais práticos! E terão razão também! Mas para mim,tem o valor que eu sinto. Só lamento,não saber quem foi Serra e Moura.

"Montemorences,quem era Serra e Moura ?"

domingo, 19 de julho de 2009

Diálogo


A Lua já não era visível.As estrelas confundiam-se com a claridade do alvorecer,amanhecia.O sol subia no horizonte e afagava os ornatos superiores do maior edifício de Montemor-o-Velho - os Paços do Concelho.O sol chamou-lhe Palácio e enquanto o acariciava com o seu calor e despertava para mais um dia,disse-lhe:
- Sabes Palácio,tenho pressa em iluminar-te,sabes porquê?
- Não,diz-me...
- Porque és bonito! És um Palácio soberbo!
- Gosto do galanteio - retorquiu - eu já tenho muitos anos,estou de pé desde 1892.Já vivi muito,tenho muitas recordações,boas,menos boas e,saudades.Mas os teus elogios não apagam as minhas mágoas...
- Mágoas? Tu?! - inquiriu o sol - queres desabafar?
O grande palácio,um tanto austero,tomou então da palavra com uma calma triste:
- Esta Praça,que se chama da Républica,está mais desolada que um largo duma pequena aldeia remota.E no entanto,tem um desenho tão belo,dela até se vê o Castelo,que é a coroa da Vila ! Mas tão árida,nem uma flor,nem uns jactos d’água que a enfeitem,nem população,apenas um largo,que tristeza...
- Ora,Palácio,são os efeitos da crise,que há-de terminar... Não! O que te digo é anterior à crise.Sou velho mas ainda consigo destrinçar. Aos domingos e dias feriados esta Praça é sinistra de tão vazia. Nem calculas a tristeza que me invade nesses dias.Nem um restaurante,nem um café aberto...Lembra um suicídio colectivo,um êxodo total! É então que na minha solidão recordo o passado,quando os bancos à minha porta eram poucos para os trabalhadores que aí se sentavam para descançar e conversar,nas tardes de domingo! Nos passeios que me contornam,acomodavam-se também as mulheres que vendiam tremoços e castanhas,e os engraxadores com a respectiva caixa para o seu trabalho. Formavam-se grupos,que falavam,havia vida... No café Girão,pequeno mas acolhedor,os homens preguiçavam na explanada sobre o passeio,enquanto o empregado,(o Manel do Café),impecável no seu casaco branco e no seu trato,os servia incansável.Será que ainda vive? Mesmo na minha frente,o Café Mondego,pequenino,o Café do Henrique,o inventor das Espigas Doces,essa delicia!
- Um inventor? Em Montemor?
- Há! Sim,ele devia ter lido o Fernando Pessoa - "quando Deus quer,o homem sonha,a obra nasce!" Sonhou e tornou realidade um doce para Montemor,como era então conhecido.Que saudades desses tempos.O meu coração de velho não esquece,nada me alegra...
- Queria animar-te,meu amigo.Mas as minhas histórias são iguais às tuas.Como sabes,eu,um amigo dos turistas,vi há tempos um carro cheio deles quedar-se à entrada da Vila para as fotografias da praxe ao magnífico Castelo.Depois dirijiram-se para o centro da Vila.Era Domingo e tudo estava fechado.Deram meia volta.Segui-os num dos meus raios até Tentúgal,onde se sentaram a uma mesa de café a saborear pastéis e queijadas.
- Não digas mais...
- Voltas amanhã?
- Claro,todos os dias!
- Mas promete-me uma história mais feliz....

sexta-feira, 10 de julho de 2009

Ser Honesto parece mal ?


Eu não sei se foi sempre assim...porque a tentação e o pecado,vêm já da noite dos tempos. Também a informação era deminuta,e "amordaçada"...Por isso é dificil para mim tentar a comparação com o ontem e o hoje. Mas fico admirada com o numero de figuras da alta sociedade,a viver mais que desafogádas,e nem assim "arrumam" a ambição desmedida! Parece que só o dinheiro lhes interessa, venha donde vier! Não é aquele dinheiro"ganho com o suor do rosto"porque esse nunca é muito... E muito é que dá conforto ao corpo,e sobretudo ao ego! Retiram do pensamento palavras cujo significado passou de moda (respeito,honra,palavra,dignidade,
vergonha,seriedade)...e, vivem felizes ! O silêncio é cumplice,tudo são rosas! Mas um dia lêmos e ouvimos,corrupção,fraude,importâncias enormes desviadas, perdidas, e os nomes dos personagens envolvidos,e ficamos atónitos com a revelação,quáse incrédulos perante a falta de dignidade e respeito,pelos outros e por si próprios.
É então que os mais velhos usam a expressão "o mundo está cada vez pior"...mas eu permito-me contrapor com as palavras do poeta brasileiro,que diz : O MUNDO NÃO É MAU,NÃO É RUIM ; A GENTE É QUE FAZ O MUNDO ASSIM !
(neste caso eles,os prevaricadores)

sexta-feira, 3 de julho de 2009

Voando a Sonhar


Já algumas vezes ouvi dizer "quem não aparece esquece"!
Quem sou eu para negar afirmação tão enraizada... Se calhar é certo, e o melhor é aparecer.Então cá estou eu,desta vez com mais umas rimas (despretenciosas).

Recolhi-me cêdo
P’ra ir descançar
Só que o meu sossêgo
Foi só a sonhar.

Sonhei que voava...
O ar me impelia,
Do alto eu mirava,
E subia,subia.

Subindo ligeira,
Como águia ou afim,
Fui aventureira,
Esqueci-me de mim.

Qual ave perdida
Pelos altos cèus,
Voei decidida
Cheguei até Deus...

Ninguém lá chegou:
E eu não sou excepção.
Meu sonho acabou,
Voltei à razão.