quarta-feira, 31 de dezembro de 2008

SONHO

Estamos ainda na Quadra Natalícia,longe vão os tempos em que esperava esta festa com ansiedade e alvoroço.O tempo passou,alterou forma de pensar e agir mas ficou a recordação. E hoje senti-me bem a recordar... recordei histórias e resolvi criar tambem uma história de Natal,oxalá tenha engenho para o que me proponho.

Aquele velho Palácio outrora quase um Castelo,tornou-se uma ruína.Pelas inúmeras fendas dominantes em toda a sua estrutura entrava o vento que furiosamente sibilava,e, triunfante,repetia em cada rajada:
- Vê velho Palácio,de nada valeu teu porte altaneiro,tudo tem seu fim, o tempo aniquila... Tantos anos rodopiei em teu redor usando as minhas forças,parecias inexpugnável!Eu dizia para mim: -Não serás eterno! Eterno sou eu ! E hoje aqui estou passeando livremente nas tuas salas como rei e senhor.Sabes Palácio,hoje é Noite de Natal !
E o velho Palácio semelhante a um velho Fidalgo de cãs embranquecidas e alquebrado pela idade,murmurou num misto de coragem e dignidade:
- Sei, sim,é Natal! Como poderia eu ter esquecido?
- Sim,recordas o conforto dos teus aposentos,as amenas cavaqueiras,a Família,as lautas Ceias de Natal...
E o Palácio retorquiu agora com altivez :
-São famosos os serões na Província,aqui assisti a muitos.E tambem às Consoadas aonde estavam presentes os Trabalhadores da Quinta e os pobres do nosso pequeno Povoado; o Senhor Seabra era um bondoso coração !
A Lareira,ainda cheia de lenha mas apagada,suspirou e repetiu tristemente:
-Era um bondoso coração... Para aqui estou, fria e inútil. No seu tempo eu crepitava e aquecia as crianças da Aldeia sentadas à minha volta,enquanto ele lhes contava histórias nas tardes frias de inverno; de tanto as ouvir eu as aprendi: “Era uma vez um Capuchinho Vermelho que ia a ...”
-Cala-te velha desdentada ! -rugiu o vento furioso,fazendo cair mais um pedaço de estuque;agora o Senhor sou eu,destruo a meu belo prazer e detesto ouvir falar de ternuras.
O luar deixou de brilhar,a sala tornou-se negra como brêu e subitamente,um após outro,os relâmpagos rasgaram o céu. Um trovão fantástico ecoou e num clarão imenso de mil côres a lenha da lareira incendiou-se dando luz e calor àquela sala triste. A porta rangeu nos gonzos e deixou passar um vulto,talvez o do velho Fidalgo - o Senhor Seabra- que avançou lentamente e alcançou o maple estofado a seda,gasto pelo uso e coberto de poeira. Sentou-se frente ao lume que crepitava e desenhava nas curtas labaredas danças fantasmagóricas jamais executadas. O silêncio voltou àquele Palácio em ruína.
Pouco depois vozes maviosas ouviam-se à distância entoando em côro canções de Natal e, pelo canto do vidro quebrado da janela,distinguia-se iluminada por uma bela estrela a Gruta de Belém.
Mas não eram as habituais figuras estáticas do Presépio que lá estavam. Ali tudo era físico,humano, e até o Menino Jesus ora dormia,ora chorava,como fazem os bébés recém nascidos.
“Maravilha” pensei, “vou pedir à Virgem Mãe que me deixe pegar o Menino nos meus braços! “ E corri; corri tanto, tanto, até cair de cansaço.



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