terça-feira, 3 de fevereiro de 2015

Adeus Amigo

Eu teria talvez uns dez anos quando o meu pai me presenteou com uma máquina fotográfica, um "caxotito" com capa de plástico verde escuro, com alça para colocar ao ombro. ( Eu já aqui contei isto, assim como a aquisição posterior doutras máquinas de melhor qualidade, que ainda hoje guardo como recordações.) Funcionavam com rolos de oito fotos, e como em Montemor não havia laboratório de revelação, era em Coimbra que as películas eram reveladas e as fotografias impressas.

Isto até ao dia em que um jovem com pouco mais de vinte anos, se abalançou a trabalhar na arte da fotografia por conta própria na sua terra, a  Figueira da Foz.
Estava longe a publicidade organizada, e ele dirigiu-se a Montemor para visitar o meu Pai, que era seu primo, e dar-lhe conta da responsabilidade que tomara, pois iria começar daí a dias a trabalhar no seu pequeno estabelecimento, A Foto Liz.

O meu pai gostou de saber, desejou-lhe muito êxito, e naturalmente ficou cliente.
Eram os motoristas da camionete da carreira que traziam os nossos rolos de películas para ele tratar, e passados três ou quatro dias levavam  as fotos ; eu já estava à porta, ansiosa à espera, e eles nem paravam, atiravam pela janela. (que simplicidade...)
O tempo ia passando, e quando eu vinha à Figueira parava sempre naquele estabelecimento para um olá... Sempre me tratou por prima, estando eu até num grau familiar bastante distante para isso, o que demonstrava a estima que me dedicava.

Na altura devida convidei-o para o meu casamento, e para fazer as fotos. Ele aceitou sem reservas. Foi há muito tempo, mas recordo ainda a sua alegria a abraçar o meu pai, e sorridente a dizer para o cunhado que era o Fernando cabeleireiro e para outro amigo "vocês têm pena de não terem uma prima tão linda como eu tenho..."

Muitos anos depois viémos residir para a Figueira da Foz. Ficámos mais perto... Quando do casamento da minha filha ele esteve connosco; eu já não tinha o meu pai, mas ainda tinha aquele primo ali a meu lado, a presença amiga do único parente que restava do lado dele.

Guardo alguns trabalhos seus; algumas ampliações, e uma em especial,  a côres, de quando a fotografia era apenas a preto e branco e as côres eram aplicadas pelo fotógrafo.
Ele tornou-se um mestre também na arte da recuperação de retratos antigos, era mesmo um artista.

Um artista que ontem desapareceu para sempre. Chamava-se António Brandão Faria, partiu na viagem sem regresso, e não voltará mais à sua Foto Liz...

Encarei este facto em silêncio, mas com mágoa. Eu sei que ele apenas nos leva a dianteira, pois é caminho que nos espera a todos, mas isso não é suficiente para me alhear da triste realidade, e não sentir que perdi um amigo.


( a foto que coloquei pertence ao blog O Palhetas na Foz )

8 comentários:

Ivone disse...

Linda amiga, sei bem como é isso, o coração sente, não há como negar!
Deixo aqui minhas condolências!
Seu texto me fez relembrar de tantas coisas, tenho máquinas fotográficas antigas, uma filmadora enorme e outra bem menor, mais moderna, mas mesmo assim já ultrapassada, tudo se renova, a vida é assim mesmo, nós precisamos estarmos sempre dispostos a aceitar isso né minha doce amiga?
Abraços bem apertados!

jair machado rodrigues disse...

Sinto muito minha querida amiga Dilita,lamento muitoa perda deste ser tão querido para vós...nobre a arte que ele trabalhava, um eternizador de momentos (felizes como teu casamento), mas estaénossasina, este é nosso caminho nesta existência. Fica bem amiga.
ps. Carinho respeito e abraço.

Mona Lisa disse...

nestes momentos não são precisas palavras.

Deixo-te um abraço apertadinho.

Beijinhos.

Manuel disse...

É dificil ver partir quem nos deixa marcas e recordações tão positivas.
Mas, enquanto o lembrar, continuará presente na memória.
Como diria o Camões "se lá memorias desta vida se consentem" irá ficar feliz por essa linda homenagem.

dilita disse...

Querida Ivone

Muito obrigada.
A idade não perdôa, mas eu não pensava nisso... e foi uma surpresa triste.

Retribuo abraços, e junto dois beijinhos.

dilita disse...

Caro Jair

Agradecida pela sua atenção.
Abraço amigo.

dilita disse...

Lisa amiga

Tem razão.
Agradeço o seu abraço, e a sua "presença".

Beijinhos

dilita disse...

Olá Manuel

Grata pela visita e pelas palavras amigas.
Sim, na memória ficará, como acontece com quantos já partiram, mas que antes me marcaram com a sua estima.

Gostei da afirmação do nosso Camões.
Só que o "lá", não sei se há...

Abraço.