quarta-feira, 2 de setembro de 2009

Simplesmente Mulher!


" Recordar é viver" sempre ouvi e não discordo,mas não será antes recordar é reviver,(voltar a viver algo que nos marcou,pela alegria ou pela dôr) acontece quando a mente nos trás "o filme"... Reviver,gosto mais ! Bem,mas não foi para falar dos meus gostos gramaticais (talvez descabidos), que hoje estou a premir as teclas...
Volto ao meu Montemor,para falar dum caso ligado ao seu Hospital,isto nos anos cinquenta.Era a unidade de saúde que havia,e todos ali acorriam quando a saúde assim o exijia.Um dia foi ali internada uma jovem,que era orfã de mãe,e vivia com as duas Tias que a tinham criado,e que lhe queriam como filha.Ela era bonita,educada e ingénua.Rápidamente as Irmãs de Caridade a cativaram para que ficásse no hospital a trabalhar.Restabeleceu-se e aceitou a oferta.Não tardou a vestir a farda amarelinha,de ajudante,que tão bem lhe ficava.As Tias não desgostaram,embora não dessem consentimento para que aquele emprego fosse definitivo,seria apenas temporário,assim,durante o tempo mais frio. Ela movia-se alegremente na sua nova vida, as tias iam vê-la quando queriam,e pensavam"qualquer dia ela vem embora"!
Porém,um dia quando a tia chegou ao hospital para a vêr,ela já lá não estava.Ansiosa,aflita fez perguntas,mas a resposta embora delicada foi lacónica;tinha aderido à Ordem a que elas pertenciam,e que daria noticias.A Tia voltou para casa cheia de lágrimas,e de lágrimas foram os seus dias e noites,durante muito tempo.A outra Tia secou-se-lhe o pranto com a revolta e a raiva que passou a acalentar contra as Irmãs de Caridade,em especial à Sra.Superiora que era quem mandava:e fazendo paralelo com São Cipriâno,enquanto Bispo Maldito,repetia em modo pejorativo:- a culpada é aquela Sra.Cipriâna ! - Aquela Cipriâna é que a iludiu,ao ponto de ela nos deixar! Esperaram noticias em vão,e decidiram elas escrever,mas para onde?... depois de muito implorarem lá conseguiram que a Sra.Superiora aceitásse uma carta,para lhe enviar... será que enviou? nunca ninguém soube,resposta não veio. Magoadas,tristes,e desiludidas,sentiam que não voltariam a ver a sobrinha,e lentamente foram-se resignando. Ao fim de muitos anos mandou uma carta com "meia duzia de palavras",e calou-se de novo. Noticias nunca mais. E o tempo passou...
Numa tarde fresca e soalheira, pára um táxi em determinado ponto da rua principal da Vila; dele sai com alguma desenvoltura,uma figura vestida com o hábito igual ao de Superiora do nosso hospital; era ela, vinha só,ainda bonita apesar do tempo que passara. Para as Tias agora já idosas,esta verdade parecia-lhes um sonho,um sonho lindo.Ficaram a saber que ela estudou,aprendeu bordados e rendas,arranjos florais,musica,e tocava orgão... viajou,residiu em Espanha e na Ilha da Madeira,sempre dentro dos limites impostos pela Ordem,e decerto se sentia feliz.As Tias estavam contentes,julgavam que ela vinha de férias,e agora já aceitavam a separação com naturalidade,pois só o bem estar dela lhes interessava.Porém (o coração tem razões que a razão desconhece) (afirmou quem sabia ! ) - " O Cupído apontou a seta, e acertou"... A "freira" estava apaixonada !
No dia seguinte ao da sua chegada, foi à Igreja interpretar no orgão algo de que gostaria em especial,e envergava ainda o hábito,mas ao regressar despiu aquelas vestes para sempre. Deixou de ser freira,passou a ser, simplesmente mulher !

Sem comentários: